outubro 21, 2014

O livro de reclamações, se faz favor!

Há dias em que me imagino a chegar à recepção da Maternidade e pedir o livro de reclamações. Não penso em reclamar sobre os produtos filhos em si, que vieram em óptimo estado, mas reclamar sobre as limitações de utilização. Todo o bom vendedor deve, na minha opinião, informar o interessado não só das qualidades do produto mas também das suas performances de uso (mais positivas ou menos positivas). A mim, os vendedores amigos/família, só me falaram do quão maravilhoso seria o mundo da maternidade, o amor incondicional que sentiria por um filho, o quão fascinante e cheia de histórias passaria a ser a minha vida.
Mas ninguém me alertou que ter filhos implicava viver de perto com a imprevisibilidade total, mudar os planos de um dia para o outro, às vezes durante a noite, a galope de uma febre que surge sem avisar. Ninguém me avisou que não podia ter um plano semanal (quanto mais mensal) e imaginar que o cumpria à risca, porque as peças do meu puzzle, os meus filhos, muitas vezes não se encaixariam na perfeição dos rabiscos feitos na agenda.
Ninguém me avisou que ter filhos implicava passar noites sem dormir, com o coração apertado porque eles estão com dores, gemem e não mostram sinais de melhoras, enquanto equacionamos se vamos para o hospital ou aguentamos até o sol nascer. E enquanto os ouvimos, tentamos esquecer o nosso cansaço e pensamos se estamos a fazer o melhor... para eles.
Ninguém me alertou para o facto de que, a partir do momento em que fosse mãe, todas as minhas decisões iam começar a ter esta questão subjacente: Será que estou a fazer o melhor para eles?
Ninguém me avisou que vê-los doentes era pensar inconscientemente no pior, desejando sempre o melhor. Era sofrer com eles mesmo sabendo que há situações tão mais graves. Era chorar com eles,   sempre que tentam invadir o seu espaço, corpo e vontade, ainda que seja para o seu bem.
Disto, e muito mais, ninguém me avisou.



Hoje relembrei quando o R. ficou doente a primeira vez. Era Novembro, ele tinha cinco meses e meio e eu tinha acabado de voltar a trabalhar. Dias antes, durante o fim de semana, ele começou a fungar do nariz. Normal, pensei eu. (Ninguém me falou que um filho podia ficar doente, e quando ficasse o que teria que fazer com ele!) Com o passar dos dias, a expectoração aumentou, a tosse também, até que me ligaram da creche porque ele estava cheio de febre. Corri para o ir buscar, dali fui para o médico, e depois de auscultações, observações e exames (e coração de mãe a palpitar) chegou o diagnóstico: "Bronquiolite, com muitos cuidados, e pelo menos três semanas em casa!".
Wow! Três semanas?! E o trabalho? O que é que eu digo, como justifico? E como é que nós fazemos? E as compras do supermercado, que faço sempre à sexta? E as refeições, que preparo diariamente. Não tenho sopa para ele feita para os próximos dias! 
Depois de estabilizada a parte prática da questão foi ver-me (nos) a braços com um bebé de cinco meses, bem doentinho (dentro do quadro), a deitar por terra a nossa imagem e fantasia de que um filho se adapta a nós e à nossa vida. É verdade, mas nem sempre. E ninguém nos prepara para estas excepções que vêm anexas à maravilhosa experiência que é (a sério) a maternidade!
Quatro anos depois, volto ao hospital com o mais pequeno. Os mesmos sintomas, os mesmos cuidados, o mesmo aperto no coração. Mais consciência do antes, durante e depois, maior tranquilidade, é verdade, mas um filho por ser o segundo, não deixa de nos deixar preocupados, de nos virar a vida do avesso com as imprevisibilidades que lhe estão inerentes. Um filho é sempre um filho, maravilhoso e que nos enche o coração e a vida, mas também que nos permite reclamar.





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1 comentário:

Carolina Mendonça disse...

É incrível como me identifico com cada palavra... É mesmo assim, um filho vira-nos a vida a contrário, e por mais que em alguns dias desdiga desta minha vida, refile com as birras e as noites mal dormidas por causa do raio dos dentes que teimam em demorar a sair, a verdade é só uma - já não consigo viver, nem sequer imaginar o meu mundo sem ser virado do avesso pelo meu godzila Sebastião.

As melhoras para o teu pequenino.
Um beijinho
Carlina