dezembro 16, 2014

Acabou por morrer... *



há pouco mais de uma semana. Os risos e as correrias não denunciaram a falta do pai, do marido, do avô. A vida simplesmente continuou, como teve que continuar há meia dúzia de anos quando lhes morreu a mãe. Quem passa por tamanha tragédia em tão tenra idade, cria as suas defesas, as suas carapaças, para se proteger e não se afundar. Tem que ser. São mecanismos que a nossa mente vai buscar para se conseguir manter à tona. Os risos e as correrias mascaram a dor profunda que se sente, mas que não se quer sua, a falta que se tem todos os dias e horas e minutos, mas que não se quer ter. 
Hoje no silêncio da manhã, ouvi a azáfama normal e rotineira da casa ao lado. (paredes... é impossível não ouvir...) No meio dos "levanta-te!, despacha-te!, calça-te!, olha que apanhas, tu vais ver!" ouvi também a ameaça de levar esta criança para uma instituição... fiquei estarrecida! 

Na minha cabeça ocorreram logo mil maneiras de poder transmitir à minha vizinha que por muito que ela esteja a sofrer pela falta do companheiro, aquela criança que nem tem lembranças da mãe e que ficou agora sem o pai, está a sofrer muito mais. Apeteceu-me ir a correr dizer-lhe que só passou uma semana, ainda há muito luto para fazer, muito mimo para dar, que vai ser um longo caminho a percorrer, que vai ser muito difícil, mas sempre mais para ele. Apeteceu-me alertá-la que vai ter que amar muito aquela criança que não é sua, se esse foi o compromisso que fez, e que também vai ter que educar, mas com muito muito amor, sem ameaças, sem o colocar de lado nas contrariedades das primeiras horas da manhã. Ai, queria tanto dizer-lhe que uma criança sem pai nem mãe se sente tão perdida, tão insegura, tão sem chão, que a última coisa que precisa de ouvir é que há a possibilidade de ir para uma casa cheia de meninos abandonados, que crescem sem os pais, sem carinho nem amor. Que estas palavras, que acredito terem sido ditas no calor do momento, não se podem dizer, não podem ser ouvidas, não podem ser transmitidas a uma criança que vai crescer sem as suas referências. Queria tanto dizer-lhe que o mundo já é ameaçador demais para ele, o que ele precisa é de se sentir seguro e amado. Só.

Minutos depois ouvi o bater da porta. A vida continuou, com as risadas e correrias do costume. Mas as palavras tenho a certeza que ficaram lá, em tom de ameaça, no ouvido e no coração daquela criança...




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2 comentários:

Magui disse...

Por muito que esteja a sofrer isso não se diz, isso é de "madrasta má"... É óbvio que não tem o amor suficiente por essas crianças que não são dela ou não seria capaz de dizer uma maldade tão grande...

Inspired disse...

Cortou-me o coração... :(