sabemos que tudo tem um fim, conhecemos a finitude da vida, uns mais de perto do que outros, mas de alguma forma já estivemos em contacto. sabemos que nada é para sempre, mas temos sempre o fim como uma certeza muito distante. é daqui a muitos anos, é quando já formos velhinhos, os nossos filhos crescidos, quem sabe os netos, cabelos prata a rodear as rugas da experiência. a verdade é que ninguém está preparado para o fim daquilo que é tão bom. a vida.
há duas semanas, enquanto conversava com uma amiga, reparei que tinha um "alto" no pescoço, mesmo por baixo do queixo. achei (muito) estranho, mas continuei o meu dia normalmente. mas ficou ali a matutar e quase inconscientemente, volta e meia lá estava eu a apalpar aquele alto, que parecia ter o tamanho de uma amêndoa.
não costumo ser muito alarmista com nada, nem quando são coisas com os meus filhos, consigo ter cabeça fria e ser pragmática sem entrar em pânico. mas desta vez foi diferente. houve um medo, uma nuvem de pensamentos negativos que me invadiu de uma maneira que nem consigo explicar bem. ia trabalhar e, no carro, as lágrimas corriam-me só de pensar que não ia ver os meus filhos crescer, que ia perder anos tão bons junto do meu marido, os planos, as viagens, a família, os amigos... parece ridículo agora, mas imaginei as despedidas, cheguei a escrever cartas (em pensamento) com mensagens para as pessoas mais importantes da minha vida. os meus filhos, os meus filhos... parece ridículo agora, mas eu via realmente algo de mau a acontecer. e eu tão feliz, tão jovem, dois filhos pequenos, as pessoas diziam... como nunca tal me tinha acontecido, este tipo de reacção, este tipo de pensamentos, achei mesmo que só podia ser real.
entretanto consegui consulta com a minha médica. o alto estava maior, mas ia na expectativa de chegar lá e que ela se risse (no sentido figurado) da minha preocupação, que aquilo seria uma amigdalite disfarçada ou qualquer coisa muito banal. mas não. com a sua calma natural, indicou-me que fizesse uma ecografia com um especialista que, se achasse por bem, faria logo uma biopsia!
fiquei para morrer e desabei! claro que ela me confortou e disse que estas coisas podem não ser nada, mas que tem que se ver, ter a certeza, patati-patatá... só chorei, fartei-me de chorar ali mesmo. ela confortou-me mas não me disse nada do que eu queria ouvir, do género: isso não é nada, não seja ridícula!
na mesma semana, fui vista por um otorrino (parece que para coisas no pescoço, a especialidade é esta!) e fiz a ecografia. e na mesma semana gastei qualquer reservatório de lágrimas que pudesse ter...
na mesma semana, coloquei-me tantas vezes no lugar do outro. aquele que sente que algo estranho se passa e aguarda ansiosamente pela consulta. aquele que ouve, incrédulo, o diagnóstico. aquele que sofre junto. aquele que vai buscar forças que pensa não ter e luta com tudo o que tem, para adiar o fim.
eu dou valor a tudo o que tenho. sempre dei. a todos os que tenho. tenho consciência de que a vida, não sendo perfeita, é maravilhosa, e agradeço muito por isso. não me queixo. e esta semana agradeci em dobro.
o diagnóstico chegou: pedra na glândula sub-lingual (nem sabia que existia). antibiótico, dieta e consulta para revisão. nada de mais, respiro fundo e sorrio.
todos temos noção da finitude, que nada é para sempre, mas todos cremos que o fim será bem longe, num velhinhos distante, daqui a muitos anos, no ciclo natural da vida. ter a noção clara de que o fim pode ser já ali, torna cada dia único, percebemos que nada é para sempre e que temos mesmo que agradecer, viver cada dia como se fosse o último e dar valor às coisas mais simples mas mais bonitas da vida.
e isto, não são frases do Pinterest, é a realidade!
Boa semana! Aproveitem bem!
Sofia**